segunda-feira, maio 11, 2009

O NOSSO BERÇO

A tese de que a África é o berço da Humanidade não é novidade há muito tempo. Absorvi com especial deleite a leitura da magnífica obra “Uma Breve História do Mundo” de Geoffrey Blainey, que no capítulo 1, sob o título “Vindos da África” e os subtítulos “Um despertar” e “O Colombo Negro” me levou a uma maior identificação com a terra onde sempre me orgulhei de ter nascido e vivido os melhores anos da minha vida.
A novidade mais recente nos foi trazida agora pela maior investigação científica jamais realizada sobre a diversidade genética da África, berço da humanidade há cerca de 200.000 anos. O estudo foi realizado pela Universidade da Pensilvânia, sob a coordenação da antropóloga e geneticista Sarah Tishkoff, durou mais de dez anos, incluindo a coleta de material genético de 3194 integrantes de 113 populações da África. A conclusão mais sonante foi que o homem moderno surgiu numa região situada no sudoeste africano, precisamente, na fronteira entre Angola e a Namíbia.
É ali que vivem hoje aproximadamente 100.000 pessoas do povo San, que se sustentam essencialmente da caça e da coleta. É o povo africano de maior variedade genética, a tal ponto que os pesquisadores da Universidade da Pensilvânia foram levados a concluir que os antepassados dos Sans é que deram origem à humanidade. Outras pesquisas já mostraram que uma distância gradativamente crescente da África leva a uma sucessivamente menor diferenciação de genes das populações do nosso planeta. Portanto, isso também leva à conclusão de ser a África o berço da humanidade, pois a população original teve mais tempo para acumular variações no seu genoma, o que é denominado de "efeito fundador". Efetivamente, as populações mais distantes da África são descendentes de grupos migratórios pequenos e relativamente recentes, o que é traduzido em maior homogeneidade genética.


Sans do Sudoeste Africano (Fonte: Veja, 12/05/2009).

A pesquisa americana concluiu ainda que os antepassados dos Sans viveram a primeira diáspora pela África. Também, que um bando tribal de até 150 integrantes teria deixado a África, há 50.000 anos, cruzando o Mar Vermelho em direção à Ásia e daí conquistou o mundo. Realmente, os africanos colonizaram primeiro o hemisfério norte, bem antes de serem colonizados pelos povos brancos, os seus descendentes. Que ironia do destino!


Por fim, os pesquisadores descobriram que todos os africanos são descendentes de catorze populações. Para obterem esse resultado, eles compararam os padrões genéticos com a etnia, a cultura e a língua dos povos pesquisados. Descobriram fortes relações entre os traços genéticos e a cultura de cada povo, com poucas exceções.


A diáspora dos Sans (Fonte: Veja, 12/05/2009).

O estudo abriu também caminho para curar algumas mazelas do continente africano, com novos tratamentos para a AIDS ou SIDA, malária e tuberculose. Isto porque, segundo Sarah Tishkoff: "os africanos têm sido negligenciados nas pesquisas de mapeamento genético porque o acesso aos grupos com maior diversidade genética é difícil”.
Não é uma satisfação verificar que o Jardim do Éden se situou bem próximo da nossa abençoada terra de Angola?


O médico e artista plástico Richard Neave, da Universidade de Manchester, especializado em reconstituição facial, mostrou há dez anos como era o rosto de Luzia, o fóssil mais antigo de um brasileiro, com 11 500 anos. Recentemente, Neave reconstituiu a face do primeiro europeu, baseado em partes do crânio e da mandíbula de um Homo Sapiens de 35 000 anos encontradas em 2002, na Romênia. A semelhança entre as duas reconstituições ajuda a entender que as diversas etnias humanas provieram de uma população reduzida de seres humanos e que as feições caracteristicamente negras dessas reconstituições confirmam a tese do berço comum da humanidade. Walter Neves, arqueólogo da Universidade de São Paulo, afirma que "o processo de diferenciação que produziu brancos, negros ou japoneses começou há 10.000 anos e acrescenta que "antes desse período, todo mundo possuía rosto semelhante ao dos atuais africanos.  A semelhança entre Luzia e o primeiro europeu se deve também às técnicas de Neave, que sabe como poucos especialistas em reconstituição como os tecidos da face se amoldam a determinados tipos de osso.


O antepassado europeu e a Luzia brasileira (Fonte: Veja, 12/05/2009).

As conclusões das pesquisas genéticas têm sido um duro revés para os racistas, xenófobos e nacionalistas empedernidos, pois têm dado sustentação ao grande ideal proclamado pela frase de Mirza Hussain Ali: “a Terra é um só país e os seres humanos são os seus cidadãos”.
Um grande abraço do Kabiá-Kabiaka.