sábado, janeiro 14, 2006

JOÃO, "O ANGOLANO EMANCIPADO"

Lá vai João

Com a filha na kakunda,

A esbanjar emancipação...

A Terra Prometida

É coisa do passado

Que a guerra deixou ao lado

Da estrada da sua vida.

Deixa pr'a lá,

É o mundo louco

Dos poucos que têm milhões

E dos milhões que têm pouco!

Lá vai João

Com a filha na kakunda,

A gritar a emancipação:

"Ó freguês, mais uma vez,

Deixa pr'a lá, vem cá,

Aqui, bem fresquinha, tem laranjada, tem limonada!"

.

Kabiá-Kabiaka



Nota: João Kessongo, 27 anos, natural de Benguela, casado há 5 anos com Domingas Tchoya, 24 anos. Ele é pescador durante a semana, aos finais de semana ajuda a mulher a vender refrigerantes no jango do clube de Golfe de Luanda. Deixou a sua terra natal para tentar a sorte em Luanda. Consegue a muito custo, claro, manter a familia um pouco acima da linha da pobreza. O casal tem apenas uma filha. Vivem numa kubata, construída dentro de uma quinta (arredores do campo de golfe), onde ele exerce as funções de "guarda nocturno".

História e fotos enviadas de Angola por Mona, a quem manifestamos a nossa imensa gratidão, até como incentivo a outros leitores deste blog para que façam o mesmo com flagrantes da vida real da nossa boa terra.

quarta-feira, janeiro 11, 2006

MUITA BANGA


Oi Chibante!
Oi Amante!
Encosta pr'á canga,
Pr'á frente boi...

Oi Suzuki!
Oi Toyota!
Tempo do Kota Kimbaça já foi... [1]
Minha carroça tem mais banga,
Pr'á canga boi,
Como no tempo do Kota,
Não sai da rota...


Kabiá-Kabiaka
Blumenau, 11/01/2006

[1] Kota Kimbaça - Sr. Emílio Dias, um dos três pioneiros de S. Jorge do Catofe, juntamente, com os Srs. João de Oliveira e André de Oliveira; era exímio pecuarista e adestrador de bois para tração de carroças e alfaias agrícolas.

terça-feira, janeiro 10, 2006

A MINHA SAVANA



“Quando estamos longe da pátria
nunca a recordamos em seus invernos”
-
afirma Pablo Neruda.
“Longe da minha terra,
nunca a recordo pela guerra
ou seus infernos”
-
remato eu.


Blumenau, 15/09/2004


Na minha savana há morros negros
De pedra sã,
Altaneiros,
Como a negra gente irmã
Dos brancos pioneiros,
Que foram embora
Mundo afora...

Na minha savana há morros escuros,
Duros,
De pedra dura,
Resistente,
Como a alma pura
Da nobre gente,
Primeira
Ou derradeira.

Os morros da minha savana
Vão cercando,
Rodeando,
As baixas infinitas
Como os sonhos, a mando
De quem as desbravou
E domou.

Corre na minha savana um rio
Pelas baixas serpenteando,
Cantando e chorando...
Corre na minha savana um rio
De águas límpidas
Que o sangue manchou...

A negra bruma sobe cada morro.
A tinta espuma desce o rio.

Amigo vem, vem comigo!

Não sei quem, alguém chama...
Na savana,
Eleva-se o grito de “socorro”
E desce a minha espinha um arrepio.

Amigo vem, vem comigo!

Quem são os que clamam?
Não sei, mas se me chamam,
Então, eu sei que são meus
E também são teus.

Amigo vem, vem comigo!

Eles me gritam:
“Morremos
E sofremos”.
E me incitam:
“É o teu povo,
Enganado,
O teu povo deserdado,
Na savana estendido,
Entre os morros e o rio,
De fome, de dores,
Não se ergue só por si,
Espera por ti, amigo”.

Amigo vem, vem comigo!

E, também tu, a que amo,
Pequena,
De tez morena,
Qual rara flor do cacimbo [1]
Em plena seca do arimbo... [2]

Amiga vem, vem comigo!

O combate será duro,
Como o granito puro
Dos morros da minha savana.
A vida será dura,
Por um fio,
Como é pura
A água do meu Catofe,
O meu rio.

Mas, vem comigo,
Meu amigo!
O sonho nos liga!
Amiga vem, vem amiga!

Haverá mais quem nos siga?!

Kabiá-Kabiaka


1 Cacimbo: estação seca de Angola, caracterizada pelo frio e neblina, durante a noite e início da manhã.
2 Arimbo: lavra, lavoura, roça.

sexta-feira, janeiro 06, 2006

BLUMENAU MEU...


Blumenau na curva do rio... Posted by Picasa

Eu na curva do rio...

Na curva do rio,
Eu me escondo,
Mas me reencontro com o meu Eu!...

É aqui que o meu calor angolano
Misturado à cerveja alemã loira-gelada
Se reencontrou com o pulsar nostálgico açoriano
Para desaguar no meu espírito atlântico,
De sete mares,
De sete partidas...

Blumenau meu,
Rio Itajaí-Açú,
Sendo tu,
Sou mais EU!

Com um abraço do
Kabiá-Kabiaka